Conflito no Oriente Médio: 12 meses de Mortes e Traumas sem vencedores
Antonio Celso Ribeiro Brasiliano, PhD,
Doctor of Philosophy in International Security Sciences, pela Cambridge International University, Inglaterra, Reino Unido.
Presidente da Brasiliano INTERISK.
Outubro | 2024
Após 12 meses de conflito entre Israel x Hamas x Hezbollah x Irã, não sabemos hoje quem é o vencedor de fato e de direito, em função dos danos diretos e colaterais que as forças em combate infligiram umas às outras.
Clausewitz escreveu, em seu livro Da Guerra, que em todas as guerras deve haver objetivos claros e específicos integrados com um plano de sustentação às vitórias no campo de batalha. Ou seja, é preciso garantir que o exército vencedor esteja libertando o povo de seu “monarca” impiedoso e cruel. Por esta razão Napoleão entrava nas cidades sendo recebido de braços abertos pela população. Onde isto não aconteceu, onde o próprio povo lutou nas ruas, nas vielas, nas estepes geladas, Napoleão acabou perdendo a guerra. Foi assim que Napoleão saiu derrotado na Rússia. Apesar de sua astúcia, não enxergou que uma guerra de guerrilha é feita com a vontade do povo, apesar de o exército vencedor achar que vencer a batalha é vencer a guerra. Isto aconteceu om os Estados Unidos no Vietnã, Iraque e Afeganistão; aconteceu também com a Rússia no Afeganistão e com Israel, nas duas invasões que protagonizou, em 1979 e 1982.
Israel já perdeu no Líbano e nas duas últimas vezes teve que se retirar. Em 6 de junho de 1982, Israel invadiu o Líbano pela segunda vez, dessa vez em uma incursão de maior escala, que chegou até Beirute. A operação militar é hoje descrita por alguns especialistas como a mais desastrosa da história de Israel e apelidada de "Vietnã israelense", em alusão à invasão dos EUA ao país asiático. Oficialmente essa invasão tinha como objetivo fazer cessar os ataques dos palestinos da OLP (Organização para a Libertação da Palestina), baseada no Líbano. Foi um conflito também sangrento e cheio de manobras para dissuadir a violência praticada. Para termos uma ideia, em 16 de setembro de 1982, com a permissão israelense, milícias cristãs libanesas invadiram os campos de refugiados palestinos de Sabra e Chatila, na parte oeste de Beirute, e massacraram a população civil. Não se sabe se o exército israelense desempenhou um papel ativo na carnificina.
Os EUA enviaram suas tropas ao Líbano depois do massacre de Sabra e Chatila, retirando-se em fevereiro de 1984, em razão das pressões internacionais e da resistência árabe (sírios, libaneses e palestinos). A saída das tropas norte-americanas e, em seguida, das israelenses enfraqueceu os cristãos.
Em abril de 1998, o gabinete israelense anunciou a intenção de cumprir a Resolução 425 do Conselho de Segurança da ONU, que determinava a retirada do Exército de Israel da faixa de 15 km no sul do Líbano e o estabelecimento de uma força de paz no local.
Finalmente, em 2000, os israelenses se retiram do sul do Líbano, permanecendo nas fazendas de Shebaa, próximo às Colinas de Golã, pois Israel não considera essas fazendas como território libanês.
Na verdade, quando os especialistas falam que a invasão do Líbano foi a mais desastrosa da história de Israel e por isso a chamam de "Vietnã israelense", estão corretos, pois vitória não houve. Foi uma saída sem glória e com um gosto de derrota na boca. O resultado dessa operação foi o nascimento do Hezbollah. E hoje? Qual o motivo? Destruição do Hezbollah? Virá outro grupo ocupar a posição? Não será apenas mais uma aplicação da tática israelense de “cortar a grama”, como os oficiais israelenses falam quando se trata do conflito Palestino? Ou seja, sempre têm que atuar, pois o problema nunca é resolvido.
A história nos ensina que quando se tenta destruir um grupo, em seguida aparecem outros dois grupos prontos para entrar em ação. Não é possível acabar com uma ideologia simplesmente tendo como estratégia a terra arrasada. Nunca deu certo na história da humanidade. Os israelenses deveriam saber disso muito bem, pois foram escravos do Egito e nunca arredaram pé da sua fé e da sua ideologia. Qual o motivo para achar que agora os palestinos vão abandonar a ideologia deles? Basta olhar para dentro de si e enxergar qual será o futuro!
O problema central são os palestinos sem Pátria. Um erro fundamental das Nações do Mundo inteiro que se escondem atrás de protocolos e acordos de paz. Acordos estes que nunca deram certo e nunca darão, porque nunca resolvem o problema. Sempre postergam. Inacreditável como as Nações com seus líderes não querem mexer no vespeiro, mas todos pagam a conta com os conflitos do Oriente Médio. Por exemplo, com o êxodo forçado das vítimas de guerra.
Devemos entender que os palestinos sem pátria e os árabes na Cisjordânia vivem sob pressão dos assentamentos e restrições israelenses. Ressalvo que condeno veementemente o que o Hamas praticou, assassinato, mutilação, sequestro, abuso sexual de qualquer israelense em quem pudesse colocar as mãos, sem nenhum objetivo ou narrativa. Foi uma ação que considero animalesca e covarde. Mas também a forma como Israel reagiu na Faixa de Gaza e no Líbano foi desmedida e sanguinária. Também o condeno, pois acabou desrespeitando o direito internacional. Israel, de vítima, passa agora a ser algoz. O Governo de Netanyahu conseguiu isto, quebrar uma ideologia que mantinha o povo judeu do mundo inteiro unido. Hoje temos polarização em Israel. Houve a quebra de um dogma, o dogma de serem justos, honestos de caráter e de combater um bom combate. Combater fazendo o certo, lutando pelo seu país. Aliás, todo judeu de qualquer parte do mundo, voltava para Israel para lutar o bom combate. Será que isto ainda existe? Não sei! O tempo dirá, pois quando perde o glamour, quando perde a ideologia, o país fica com seu moral baixo.
Tudo isso poderia ser evitado, bastava Israel ajudar a criar um Estado Palestino. Isso favoreceria a união. Dois povos unidos, entre o Rio Jordão e o Mar Vermelho. São 77 anos que o povo palestino está lutando para ter um chão para chamar de Pátria. E ninguém faz nada!!
O atual governo de Israel, nas mãos do Primeiro-Ministro Benjamin Netanyahu, necessita de uma narrativa limpa em Gaza. Esta é a mais baixa e sangrenta guerra de que Israel já participou. Os parceiros supremacistas judeus de extrema direita de Netanyahu disseram a ele que derrubarão seu governo se ele concordar em parar a guerra em Gaza antes da “vitória total” contra o Hamas ou se ele tentar levar a Autoridade Palestina da Cisjordânia, que abraçou o processo de paz de Oslo, para governar Gaza no lugar do Hamas, algo que o Hamas teme e muito.
A ausência de narrativa impacta na veia na estratégia de Israel. Quanto mais Israel tiver um parceiro palestino legítimo, maior a chance de não ter problemas eternos e sucessivos. Com a postura de ajudar a ter um Estado Palestino, Israel teria um maior número de palestinos como aliados e poderia pôr fim a essa eterna luta entre dois povos que merecem a paz.
Sem resolver o problema, Israel fica enxugando gelo e, o que é pior, coloca seu povo em exposição, assim como o povo Palestino. Diferentemente dos israelenses, os palestinos carecem de suporte e apoio das Nações, pois hoje estão completamente vulneráveis, desesperados, sem infraestrutura, sem um lar e sem um chão para chamar de Pátria.
A médio prazo não enxergo soluções fáceis. Muito pelo contrário, se lermos o Barômetro de Cooperação Mundial de janeiro de 2024, elaborado pelo Fórum Mundial, veremos que as 5 dimensões utilizadas como indicadores nos apresentam um cenário nada promissor.
Comércio e capital: cresceu durante a pandemia e desacelerou a partir de 2023, mas as tensões geopolíticas tornam o futuro incerto;
Inovação e tecnologia: fluxo de dados e estudantes internacionais impulsionam a cooperação até 2020, mas novas dificuldades surgem em cooperar e trabalhar juntos;
Clima e capital natural: cresce a cooperação em função da necessidade premente e de compromissos assumidos, mas as emissões também aumentam;
Saúde e Bem-estar: progrediu muito em função da pandemia, mas está retornando aos padrões históricos, devido à retenção de conhecimento;
Paz e segurança: analisa o impacto da cooperação global na prevenção e resolução de conflitos.
O foco está na prevenção de mortes e na melhoria das implicações negativas de longo prazo do conflito por meio de operações multilaterais de manutenção da paz e esforços internacionais de estabilização.
A tendência de cooperação em paz e segurança demonstram declínio considerável, a partir de 2016.
Pessoas deslocadas à força:
2012 = 42 milhões
2022 = 82 milhões
O Número de ataques cibernéticos quadriplicou e os impactos aumentaram em mais de 340%
Os conflitos tiveram o número reduzido, mas o número de mortes aumentou:
2014= 150.000
2022 = 240.000
Os conflitos tornaram-se mais destrutivos
Tentativas de resolução efetiva não ocorreram nos últimos anos.
Existe a percepção de que a Terceira Guerra Mundial pode estar muito mais próxima do que imaginamos.
Espero que possamos sobreviver a mais este furacão.
Sorte e sucesso para nós.