Pontos a Considerar na
Implementação da Agenda ESG
Décio Luís Schons, CIEAI, CEGRC, CIGR, CISI
General-de-Exército da Reserva, é Vice-Presidente de Operações de Consultoria da empresa Brasiliano INTERISK
Junho | 2022
A sigla ESG (environmental, social and governance, na sigla em inglês, ou ambiental, social e governança, em português) ocupa hoje posição destaque em qualquer debate relacionado ao futuro das empresas e ao relacionamento com as partes interessadas, ou seja, com seus stakeholders.
Juntamente com o conceito associado à sigla ESG aflorou também a necessidade de quantificar e gerenciar os riscos associados a práticas não condizentes com os princípios de sustentabilidade nela enfeixados.
Uma característica muito importante dos riscos ESG é terem a sua materialização efeitos de médio e longo prazos, carregando consigo o nefasto potencial de afetar de forma imprevisível as próximas gerações. Tomemos como exemplo a degradação ambiental provocada pela extinção dos mananciais devido à eliminação da cobertura vegetal e ao assoreamento dos cursos d’água no decurso de práticas econômicas predatórias. É evidente que as consequências dessas ações somente serão sentidas após alguns anos, embora a ninguém com um mínimo de bom senso ocorra a possibilidade de negá-las.
Gestores em geral, preocupados com a apresentação de resultados contabilizáveis e a consequente satisfação dos acionistas, tenderão certamente a desconsiderar esses riscos. Trata-se aqui de um verdadeiro dilema: tomar em consideração os riscos ESG acarretará a necessidade de investimentos relevantes em sustentabilidade ambiental e a consequente renúncia a parte dos lucros no atual e nos próximos exercícios financeiros. Tal dilema, caso seja deixado à discrição do gestor, terá inexoravelmente como resultado a preponderância dos resultados de curto prazo sobre os interesses de longo prazo (não apenas da empresa, mas da coletividade afetada pela questão). Isso porque, segundo a visão tradicional, o gestor que não apresentar resultados palpáveis imediatos é sério candidato a ser substituído.
A solução repousa na conscientização, não apenas dos gestores, mas de todos os stakeholders, para a problemática dos riscos ESG, trazendo-os para participar da discussão. Tendo os stakeholders, de forma particular os acionistas, entendido a sustentabilidade em todos os seus aspectos como determinante na construção do futuro da empresa, o gestor sentir-se-á mais à vontade para manter os riscos ESG, de forma permanente, no sistema de gestão de riscos da empresa, em pé de igualdade com os riscos patrimoniais, cibernéticos e assim por diante. Mais do que isso, estará motivado a dedicar à prevenção e mitigação desses riscos a atenção necessária para, a partir dali, construir uma estrutura holística e alinhada aos interesses da coletividade, nela incluída a sua empresa.
Mesmo superados esses obstáculos iniciais, não será ainda de esperar que a grande diversidade de riscos ESG seja enfrentada de imediato, mesmo porque isso seria praticamente impossível. É necessário, antes de mais nada, construir uma mentalidade receptiva a novas maneiras de pensar e de enfrentar antigos problemas, muitos dos quais nem eram percebidos como tais. Os mais velhos hão de se lembrar do tempo em que a poluição do ar era saudada como cheiro de progresso. Capacitação aparece, nesse ponto, como a palavra mágica.
É essencial que toda a força de trabalho da empresa, desde os integrantes do Conselho de Administração até os funcionários do chão de fábrica, seja capacitada nos temas da Agenda ESG. Naturalmente, haverá necessidade de conhecimentos específicos em determinados níveis, mas a base cognitiva abrangerá os conceitos de sustentabilidade em seus três pilares:
No componente ambiental, vêm-nos à mente, de imediato, as questões ligadas à redução e tratamento de efluentes e resíduos, à diminuição das pegadas de carbono, à reciclagem, à logística reversa e à adoção dos princípios ligados à sustentabilidade ao longo de toda a cadeia de valor.
No que toca ao pilar social, o primeiro olhar será voltado para a área interna da empresa, em que o princípio da inclusão (equidade mais diversidade), o estímulo ao desenvolvimento da liderança e a educação para os funcionários obterão a primazia. Já na área externa, o apoio à comunidade, mediante medidas socioeducativas e complementação de serviços públicos deficitários, com o compartilhamento de escolas, creches e instalações esportivas, será um bom começo.
Na governança, é mandatória a incorporação de procedimentos pautados pela integridade e pela ética empresarial. Destacam-se nesse ponto a transparência e a atenção ao compliance, tendo como pedra angular um Conselho de Administração diversificado e livre de conflitos de interesses.
Neste ponto, será interessante voltarmos os olhos para a questão da integração dos riscos ESG ao sistema de gestão de riscos da empresa. Esse não é procedimento comum, tendo em vista os fatores assinalados. Uma vez, todavia, que esses novos atores (os riscos ESG) surjam no palco da análise de riscos, algumas surpresas interessantes poderão ocorrer. Saltará aos olhos, por exemplo, a íntima ligação dos riscos ESG pertencentes ao pilar social com os procedimentos de segurança da informação e de segurança cibernética. Da mesma forma, a adequada compreensão dos riscos ambientais fornecerá elementos importantes para a elaboração de planos de resposta a emergências, planos de gestão de crises e planos de continuidade de negócios, precisamente pelo fato de aqueles riscos estarem estreitamente ligados aos riscos patrimoniais e operacionais.
Nunca será demais enfatizar a necessidade de que os integrantes do Conselho de Administração e os ocupantes de cargos no nível executivo participem ativamente desse processo, respaldando os gestores de risco e a auditoria interna em suas tarefas. Só assim a Agenda ESG deixará de ser um discurso bonito para transformar-se em veículo de transformações positivas e agregar valor, tanto material quanto de imagem, à empresa.