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Riscos ESG e Investimentos

Décio Luís Schons,  CIEAI, CEGRC, CIGR, CISI
General-de-Exército da Reserva, é Vice-Presidente de Operações de Consultoria da empresa Brasiliano INTERISK

Maio | 2022                                                                                                                                                                           

Há cerca de um ano, os edifícios que haviam abrigado a fábrica da Coca-Cola na cidade de Palakkad, Estado de Kerala, no Sul da Índia, foram cedidas pela empresa proprietária para que ali passasse a funcionar um hospital de 600 leitos, destinado ao atendimento de pacientes de COVID-19. Aquelas instalações já não abrigavam a planta fabril da multinacional norte-americana havia anos, como resultado de um processo bastante ilustrativo da importância que os aspectos ambientais vêm assumindo no mundo contemporâneo, em particular no mundo dos negócios.

No ano 2000, a empresa fora recebida com festa pelos moradores e pelo poder público local, tendo em vista o potencial da nova planta de gerar empregos diretos e indiretos e de, em consequência, elevar o padrão de vida da população e os níveis de arrecadação governamental. Não demorou, porém, para que a planta passasse a ser alvo de protestos populares e de ações judiciais em razão do uso excessivo da água procedente dos aquíferos e da poluição dos rios e do solo da região.

Após prologada batalha nos tribunais, envolvendo as diversas instâncias do poder judiciário indiano, a fábrica foi fechada, permanecendo, todavia, pendências não resolvidas: de um lado, a questão da indenização reclamada pelos habitantes locais que se diziam lesados em sua qualidade de vida e em seus meios de subsistência; de outro, a compensação cobrada pela empresa ao poder público, tendo em vista o não cumprimento dos acordos que deram origem ao empreendimento.

Se estudarmos o tema com cuidado, constataremos a existência de diversos outros casos similares, de investimentos de vulto aplicados em empreendimentos que tinham de início uma aparência promissora, mas que não tardaram a se revelar fracassos sob todos os pontos de vista. A origem do problema remete à falta de uma cuidadosa e detalhada análise de riscos de diversas naturezas, incluindo os riscos ESG, isto é, aqueles relacionados aos aspectos Meio Ambiente, Social e de Governança Corporativa.

Hoje a sigla ESG consta no linguajar do dia a dia na imprensa e nos ambientes de negócios. Para muitos, não é mais que um modismo, mas quem se interessa de fato pelo tema sabe que esse assunto chegou para ficar, exatamente por ter vindo acrescentar ao campo da gestão de riscos aspectos antes negligenciados, pois o que se levava em consideração nos processos de gestão de riscos, em sua maioria, eram (e ainda continuam a ser, em muitos casos) temas visualizados em curto prazo e com foco essencialmente financeiro.

A crescente preocupação com as mudanças climáticas, somada ao aguçamento da consciência sobre a finitude dos recursos naturais, vem gerando uma onda de conscientização em relação à necessidade de que negócios em todas as áreas incorporem a característica da sustentabilidade. Ser sustentável significa que o negócio se situa num ponto em que o uso que faz dos recursos naturais (renováveis ou não) mantém o equilíbrio com a preservação desses mesmos recursos em benefício das gerações futuras. O exemplo situado no início deste texto ilustra de forma didática um negócio não sustentável e que por isso teve um fim tão melancólico.

Os aspectos acima apresentados levaram ultimamente algumas das maiores companhias gestoras de investimentos do mundo, a exemplo da norte-americana BlackRock, a direcionar seu fluxo de investimentos para empresas que pratiquem a sustentabilidade ambiental – sustentabilidade definida como a capacidade de satisfação de todas as necessidades existentes, de tal forma que não se comprometam as necessidades dos outros, em especial as das futuras gerações. A partir de então, o atendimento a essa Agenda tornou-se praticamente um mantra nos ambientes de negócios, representando, possivelmente, uma das tendências mais poderosas já assistidas em nível global.

Nessa corrida pela sustentabilidade nos investimentos, a transparência surge como elemento de capital importância. “Se você quer que os investidores tornem o mundo um lugar melhor, forneça dados melhores” – esse é o apelo das gestoras gigantes em sua busca por empresas que forneçam dados detalhados, num espectro que vai desde a diversidade no seu Conselho de Administração até a conduta adotada diante das mudanças climáticas, com ênfase na medição das pegadas de carbono e na emissões dos demais gases de efeito estufa.

Outros conceitos são ventilados, como a Dupla Relevância (ou Dupla Materialidade), em que são analisados tanto os impactos exercidos pela empresa sobre o ambiente quanto, na mão oposta, os efeitos que os problemas ambientais e sua solução exercem sobre a empresa. Já a Relevância (ou Materialidade) Progressiva diz respeito à necessidade de se manter um olhar prospectivo sobre o macroambiente de negócios, em todas as suas dimensões, para determinar com oportunidade aqueles aspectos e fatores não relevantes para a empresa no momento presente, mas que têm alguma probabilidade de passar a ser relevantes no futuro.

Como se pode perceber, trata-se de assunto complexo e ainda pleno de indefinições, tendo em vista, principalmente, o curto período decorrido desde o momento em que passou a constar da agenda das grandes empresas gestoras de capital. Essa constatação não lhe tira a importância, muito ao contrário.

A partir dos dados hoje disponíveis, é possível concluir que esse tema estará cada vez mais presente em nosso dia a dia, pelo menos enquanto perdurar a apreensão com as mudanças climáticas, com o cortejo de desgraças que as acompanha e com a escassez dos recursos naturais de toda ordem, renováveis ou não renováveis, à disposição da sociedade.

Nesse compasso, os fatores integrantes da Agenda ESG irão pautar, de forma cada vez mais assertiva, a disposição dos grandes e pequenos investidores para colocar seus recursos nesta ou naquela empresa, neste ou naquele empreendimento. Podemos não concordar e achar que é tudo conversa fiada ou enrolação, mas essa postura não tem o condão de mudar a realidade.

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