
Processo de Gestão de Riscos Legais: contexto interno e externo e critérios – conforme definido pela ISO 31022:2020
Flavio Fleury de Souza Lima, CIEAC, CISI, CIGR
Especialista nas áreas de imposto sobre a renda, contribuição social sobre o lucro líquido, PIS e Cofins. Formado pelo CPOR/SP, é graduado em administração de empresas pelo Mackenzie e cursou direito na UNIP. Atualmente trabalha como Diretor Associado da Divisão de Risco Tributário na Brasiliano INTERISK
A gestão de riscos legais deve ser um processo interativo e integrado a todas as atividades e operações da organização, conforme ilustrado no diagrama abaixo:

Figura 1 - Fonte Norma ABNT ISO 31022:2020
É conveniente que o monitoramento, e a análise crítica, bem como a produção de relatórios, a comunicação e a consulta estejam presentes em toda a organização durante todo o processo de gestão de riscos legais.
A gestão destes riscos requer que, em complemento à norma ABNT NBR ISSO 31000:2018, sejam considerados os contextos externo e interno abaixo elencados.
Contexto externo dos riscos legais
O contexto externo dos riscos legais engloba os fatores relacionados a eles, mas que se encontram fora da organização. Dentre eles:
-
leis locais e internacionais pertinentes, bem como suas alterações;
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sindicatos e organizações de empregadores;
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serviços externos de provedores e consultores de apoio à gestão de riscos legais, tais como escritórios de advocacia, auditores externos e serviços fornecidos de gestão de informação e análise;
-
partes interessadas externas, como empresas, organizações da sociedade civil, organismos regulatórios, governos locais, público e comunidades de interesse, imprensa, mídia e grupos de interesse especiais, e suas expectativas em relação à gestão de riscos legais;
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quaisquer atos ou omissões de terceiros, como conduta fraudulenta e/ou enganosa;
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acordos internacionais aplicáveis e memorandos de entendimento;
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condições de mercado aplicáveis relacionadas à organização;
-
ações ou reclamações de terceiros; e
-
leis dos países onde seus produtos ou serviços são entregues ou fornecidos.
Quando examinamos esse contexto externo das organizações que operam em diversas jurisdições, devemos considerar todas as diferenças ambientais e culturais que existem entre elas, bem como a aplicação extraterritorial das leis nacionais e das leis locais em uma determinada situação, verificando se há conflito entre elas, identificando, inclusive, a qual jurisdição estão sujeitas.
Contexto interno dos riscos legais
O contexto interno dos riscos legais é composto pelos sistemas de governança e gestão da organização, que incluem:
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a natureza da pessoa jurídica;
-
a saúde financeira organizacional e seu modelo de negócios;
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a estrutura jurídica interna, processos e funções;
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a governança e suas estruturas de valor que promovem a integridade, tais como código de conduta e outras diretrizes de compliance;
-
o atual estado das questões e assuntos legais e sua abordagem para a gestão de riscos legais;
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campanhas de conscientização e melhoria contínua do desempenho em gestão de riscos legais para as partes interessadas, sistemas e acordos para melhorar o comportamento dessas partes em relação às leis e impedir qualquer tipo de conduta fraudulenta e enganosa, como os sistemas de gestão e de compliance;
-
experiência passada e histórico de disputas ou eventos legais desencadeados por riscos legais na organização;
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ativos da organização, tais como propriedade intelectual e outros direitos legais sobre bens tangíveis e intangíveis usados em processos e atividades;
-
o efeito dos direitos e deveres sob contrato;
-
obrigações relacionadas ao dever de cuidar;
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negligência e efeitos que desencadeiam indenizações, garantias e cláusulas de não confiança em contratos;
-
passivos decorrentes de questões trabalhistas, ambientais, tributárias e outras, decorrentes de fusões, aquisições e alienações;
-
política interna de gestão de riscos;
-
outras informações e recursos relacionados aos riscos legais e sua gestão.
Definido critérios de riscos legais
A norma ABNT NBR ISO 31022:2020 complementa a norma ABNT NBR ISO 31000:2018, recomendando que os critérios de análise dos riscos legais:
-
sejam tratados como um subgrupo dos critérios de riscos organizacionais;
-
sejam medidas identificadas e definidas para avaliar um nível significativo e aceitável de um risco legal ou de um grupo desses riscos;
-
reflitam os objetivos, valores, recursos, preferências e tolerâncias gerais da gestão de riscos em relação aos riscos legais;
-
sejam aplicados de forma crítica e regular no início de qualquer grande projeto de atualização de critérios e processos de gestão de riscos legais;
-
sejam levados em consideração sempre que derivarem da aplicação de leis, deveres contratuais ou obrigações;
-
sejam dinâmicos e, uma vez definidos, passem a fazer parte da função responsável pela gestão de riscos legais;
-
estejam alinhados com a abordagem geral e/ou política da organização em relação à gestão desses riscos e sejam ajustados às situações reais.
Na determinação desses critérios, devem ser considerados, dentre outros, os seguintes fatores:
-
objetivos e prioridades organizacionais;
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governança, com os níveis hierárquicos das autoridades e alocação de papéis e responsabilidades pela gestão desses riscos;
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relacionamento com terceiros;
-
escopo e objetivos da gestão de riscos legais na organização;
-
princípios adotados para determinar seu nível;
-
status das políticas, protocolos, estruturas, processos e metodologia dessa gestão;
-
aceitação ou nível de tolerância aos riscos legais das partes interessadas;
-
sistemática de mensuração para classificação de níveis de riscos.
Nas situações em que uma organização é obrigada a tomar uma decisão por força de lei ou, quando alguma decisão relacionada à política ou a um contrato deve ser tomada legalmente por ela é requerida a aplicação de critérios para a determinação de riscos legais.
Outras situações de substancial responsabilidade ou compliance institucional, aí incluídas investigações governamentais, alegações de violações generalizadas da lei, conduta criminosa que pode implicar a organização, uma grande não conformidade, uma perda de dados que resulte em problemas de proteção e privacidade deles, denúncias de conduta imprópria, ou, ainda, questões que resultem em perda de reputação e quaisquer outros, também requerem que sejam estabelecidos critérios apropriados para a identificação de riscos legais.
O estabelecimento desses critérios deve ser orientado por processos nos quais os riscos legais devem ser caracterizados e medidos para que possam ser, então, quantificados e o tratamento adequado seja aplicado.
A proporcionalidade na resposta ao risco legal depende da uniformidade dos critérios adotados por toda a organização, inclusive pelos seus órgãos de direção.
A adoção de critérios excessivamente restritos para a identificação de riscos legais e que não se integram totalmente aos critérios gerais de riscos adotados pela organização podem trazer consequências, intencionais ou não, de se adotar uma abordagem restrita aos problemas relacionados a esses riscos.
O envolvimento dos responsáveis pela área jurídica deve ter caráter contínuo e não se limitar às situações de crise. É ponto pacífico que a participação contínua desses especialistas no processo de gestão de riscos legais permite que as crises sejam em grande parte evitadas pela prevenção, tratamento e mitigação dos riscos dessa natureza.