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Âncora 1

SEGURANÇA

Não se faz segurança com atos e sistemas isolados: em defesa de profissionais qualificados e de uma segurança integrada.

Carlos Alberto Zanandreis da Silveira
Especialista em Gestão de crises e emergências na Fundação Renova. Professor do curso de Gestão da Segurança Privada e do MBA em Gestão Estratégica e Inteligência na segurança privada do Centro Universitário Unihorizontes.  Mestre em Administração e delegado da CEAS (Corporación Euro Americana de Seguridad) em MG.

26/08/2021

Um papel importante dos profissionais e empresas de segurança deve ser o de esclarecer e orientar a todos os usuários e ou contratantes do serviço de segurança sobre aspectos relevantes de seus respectivos planejamentos. Há um senso comum em relação a aspectos da segurança que perpassam muitas decisões a respeito dos sistemas utilizados e da forma como são geridos no dia a dia das empresas. É aí que começam grandes problemas do processo de gestão de segurança.

É comum ver muitos tomadores de decisão nas organizações, sejam de que porte forem, encararem a segurança encarada e gerida, não sob uma perspectiva técnica, mas como algo que qualquer pessoa que não seja especialista possa fazer, partindo de conhecimentos (se existem) esparsos sobre o assunto. É relevante considerar sempre que segurança é um serviço técnico e deve ser estruturado por profissionais tecnicamente habilitados para tal.

Há organizações que colocam sua segurança sob a responsabilidade de profissionais de outras áreas, ou ainda de alguém que seja antigo na empresa e que para não ser desligado, por gratidão ou amizade, é colocado como responsável da área de segurança. Nessa posição, além de não buscar capacitação adequada, faz o serviço sem tanta motivação, pois considera que está sendo deixado de lado ao ser designado a esta função. Há ainda a visão de que o custo com segurança é alto e assim, para “economizar”, o próprio administrador tenta realizar as ações seguindo manuais padronizados e conselhos esparsos de alguém que já atuou na segurança pública ou queira vender algum produto.

Nesse ínterim, é comum ouvir frases do tipo: Ouvi dizer que... Um amigo meu disse que... Eu li numa revista... Na empresa tal fizeram assim... Não há problema que qualquer profissional possa fazer um benchmarking, é aliás essencial ter este olhar, porém, é preciso ter-se em mente que qualquer decisão em relação a aspectos de segurança deve ter por base um olhar mais amplo, que avalie, em primeiro lugar, se tais ações são adequadas àquele tipo de organização e seu contexto interno e externo, e em segundo lugar se a empresa tem condições de fazer tal investimento, levando em consideração tudo que ele implica no que diz respeito a investimento, profissionais envolvidos e infraestrutura necessária. Um terceiro ponto, tão ou mais importante, é verificar se tal ação realmente atende à necessidade de mitigação de riscos daquela empresa.

Pode-se inclusive fazer uma analogia com um remédio que, receitado por um médico, pode ser útil a uma pessoa e não necessariamente ser adequado a outra, até mesmo pela dosagem que precisa ser ajustada à realidade de cada paciente. Desta analogia, o que se conclui é que, para se indicar um remédio de maneira responsável e adequada, é preciso que um profissional médico habilitado e gabaritado possa avaliar as condições de cada paciente e assim diagnosticar e indicar o remédio mais adequado e na medida mais coerente com o tamanho do problema detectado.

Quando se fala desse tema, Lima (2014) contribui afirmando que segurança empresarial é o “conjunto de medidas de prevenção que visa assegurar a integridade física e moral das pessoas e a proteção do patrimônio e imagem da empresa eliminando e reduzindo os riscos potenciais”. Ao apresentar a ideia de conjunto, o autor apresenta uma série de medidas que necessitam estar integradas e adequadas. Imagine uma orquestra dotada de vários instrumentos, mas na qual cada musicista toca uma música diferente, ou num tom diferente. Claro que essa orquestra não cumprirá seu papel e será vista como algo ruim. Neste mesmo conceito, pode-se perceber que as medidas de segurança precisam estar adequadas à imagem e cultura organizacional, e por consequência ao negócio, e que devem ser ações com potencial de atuar no sentido de reduzir os riscos possíveis que precisam, de antemão, ser conhecidos. Ainda, ao abordar o termo “conjunto de medidas”, já se entende que um processo adequado de segurança não está baseado em uma só ação isolada e desconectada da realidade da empresa e de um efetivo resultado esperado.

Quando se observam as organizações, na perspectiva de segurança, tem-se percebido, nos noticiários atuais, ocorrências de crimes, em empresas de diversos portes, passando por sérios problemas de segurança, mesmo após terem investido em algum sistema, imaginando que estariam protegidas. Nestes noticiários, inclusive, há alusão ao fato de que o local tinha um sistema de segurança, muitas vezes considerando que esse sistema é que não foi eficaz e não atendeu ao objetivo, sendo que na realidade a possível ineficácia está atrelada ao seu uso inadequado. Sabará e Alves (2015) afirmam que, desde 1996, houve um aumento considerável e grande difusão dos serviços de vigilância eletrônica, que é o investimento mais comum, constando inclusive em projetos de lei e ajustes na legislação vigente, permitindo e limitando tais serviços.

Um exemplo, é o caso de locais que têm um sistema de câmeras, que fazem gravações, porém esse sistema somente serviu para gravar a ocorrência. Muitas destas cenas são gravadas com imagens de baixa qualidade e iluminação inadequada. Em suas entrevistas e manifestações, os responsáveis destas empresas alegam ter investido em segurança, porém, neste caso especificamente, somente câmeras não impediriam que os crimes fossem perpetrados. Vê-se aí que não basta ter um sistema de câmeras se estas não são monitoradas para uma ação de resposta imediata quando da detecção de alguma invasão. Ou ainda, que não adianta ter uma câmera se os sistemas de segurança física, como portas, janelas, paredes, são frágeis e fáceis de transpor. Há uma crença de que ter um sistema de segurança, mesmo que ele não esteja adequadamente alinhado com as melhores práticas, seja o suficiente para que haja a inibição da atuação da criminalidade. Isso hoje tem se mostrado um ledo engano, visto que o cometimento de crimes tem ocorrido à luz do dia e à frente das câmeras, sem qualquer timidez.

Rodrigues (2009) disserta em seu artigo sobre segurança para escolas, que no desenvolvimento de um projeto para cerca de 2000 escolas, um problema percebido foi a instalação de equipamentos de má qualidade, não ter havido monitoramento e nem gravação das imagens, além de estas (imagens) serem de baixa qualidade de visualização e identificação. Ou seja, não basta somente colocar um sistema de qualquer jeito. A própria definição do tipo de equipamento, dos posicionamentos, do tempo de gravação, da visualização, da manutenção e integração com outros sistemas (alarmes e vigilância) deve ser algo pensado nos projetos.  Isso falando somente de um sistema de câmeras.

Um problema sério que se vê, é que estes decisores das organizações querem começar pelo que deve ser a etapa final do processo de gerenciamento de riscos. Querem começar pela medida a ser tomada. A ISO 31000, que apresenta as melhores práticas de gerenciamento de riscos no mundo, aponta exatamente um caminho necessário para que se chegue ao final com decisões de tratamento dos riscos de uma maneira concreta e metodológica. O caminho apresentado pela ISO 31000 é o de inicialmente se estabelecer o contexto organizacional em relação a gestão de riscos (Cultura, política, interesses, visão a respeito do processo de gerenciar riscos naquela organização, interesses dos patrocinadores, suportabilidade de perdas da organização, entre outros), acompanhado de um levantamento de informações internas e externas àquela empresa, e a partir disso, identificando bens, riscos, vulnerabilidades, fatores causais, capazes de mostrar o retrato atual daquela empresa, a que chamamos de diagnóstico.

Em seguida, é necessária uma análise dos riscos (medição da probabilidade x impacto) que dará condições ao profissional da segurança de apontar os principais riscos e ranquear as prioridades de tratamento daquela empresa. Tudo isso, acompanhado, o tempo todo, de um processo de comunicação com as áreas e pessoas-chaves da empresa, e de uma análise de todo o processo de gerenciamento de riscos e construção deste, visando à melhoria contínua. Só aí então é que será possível apontar quais as melhores ações de tratamento para estes riscos organizacionais, onde se poderá definir que riscos podem ser assumidos, que riscos devem contar com ações para detectar antecipadamente os perigos, que ações são definidas a partir de tal detecção (respostas) e que riscos devem ter tratamento para redução das vulnerabilidades, mitigando a possibilidade da sua ocorrência, ou até, assumir os riscos não adotando nenhuma prática de redução das probabilidades.

Meirelles (2011) salienta que a segurança é um subsistema de uma organização, tal como, o departamento comercial, administrativo, gestão de pessoas etc., que juntos vão oferecer seus serviços e conhecimentos em prol do objetivo maior, do sistema (Organização).  Mas, é também, um sistema em si que é estruturado em subsistemas para chegar ao seu objetivo, ou seja, a área de segurança para gerar os resultados que se espera dela, é suportada por subáreas, que são divididas nos diversos sistemas de segurança. Desta forma, quando se fala em segurança física, segurança eletrônica, inteligência e contrainteligência, segurança das informações, entre outras, falamos de sistemas que devem atuar em conjunto para obter o resultado esperado. O que adiantaria ter um alarme (segurança eletrônica), se não há ninguém para dar uma resposta efetiva à situação (vigilância)? O que adianta uma câmera, se não há uma visualização ativa e preventiva? Como dito anteriormente, ela servirá somente para rever como os criminosos agiram, não funcionando como um processo preventivo. E a premissa de um sistema de segurança é prevenir, para que a ocorrência criminosa não ocorra e, se isso não for possível, que se tenha uma resposta rápida e adequada.

Outro aspecto que precisa ser avaliado é que, atualmente, alguns sistemas isolados de segurança não dissuadem mais os criminosos. Estes esperam a oportunidade, observam e avaliam suas vulnerabilidades. O que adiantaria você ter um sistema que as pessoas não conhecem, não sabem operar? O que adianta ter equipamentos que as pessoas não têm treinamento e orientação de quando e como utilizar? O que adianta ter até vários sistemas de segurança, se as pessoas que atuam no local deixam portas abertas, ou agem de forma a fragilizar acessos ou acidentes? O que adianta ter os sistemas se eles não “conversarem” e não se complementarem entre si? Vê-se aí que não basta só ter isoladamente um sistema de segurança pensado.  É preciso, com o diagnóstico organizacional em mãos, definir-se a proteção, tendo por base a interligação de pessoas, sistemas e procedimentos. E tudo isso deve estar alinhado com os valores e objetivos estratégicos da organização.

Em segurança, tudo deve ser bem pensado e planejado. Ao implantar uma vigilância, por exemplo, muitas organizações pensam somente no custo e querem “baratear” os serviços, colocando vigias ou porteiros como encarregados de atividades que por lei só podem ser realizadas por vigilantes, ou ainda, querem um vigilante, mas, não se pensa no perfil deste profissional de acordo com aquilo que a organização espera para sua atividade, ou ainda, contratam empresas que não tenham a devida autorização para o fornecimento dos serviços. Os exemplos recentes de uma rede de supermercados, referentes à forma como sua equipe de segurança respondeu ao problema, mostram que uma ação de segurança mal planejada ou executada pode ser mais cara para a organização de que o prejuízo que esteja procurando evitar.

Há ainda a ilusão de que somente uma arma irá resolver o problema e temos visto nos noticiários que muitas vezes, a presença de armamento no posto de trabalho serve mais para atrair os bandidos, interessados na arma, do que qualquer outro bem da organização. Assim, da mesma maneira que citamos o exemplo do médico, sistemas de segurança precisam ser pensados de acordo com a realidade de cada organização e focados em atuar nas reais e principais necessidades da empresa, o que equivale dizer que antes de se implantar qualquer mecanismo de segurança será necessário um diagnóstico adequado, conforme apontado anteriormente. E isso não pode, e não deve ser realizado por qualquer pessoa. É preciso ter profissionais qualificados, habituados à percepção de riscos e com conhecimento amplo sobre negócios e segurança.

As próprias empresas que comercializam produtos e serviços de segurança muitas vezes focam somente em “vender”, o que é plenamente compreensível, porém, precisam também, estas organizações, não se municiarem somente de vendedores, mas, de consultores de segurança experientes que possam inclusive agregar valor aos serviços que prestam e produtos que vendem. Que possam compreender o real problema de segurança de seu cliente para oferecer uma solução possível numa relação interessante de custo x benefício.

Na pesquisa de Souza et al. (2017), os principais motivos que têm levado as empresas ou mesmo pessoas particulares a contratarem serviços na área da segurança é em primeiro lugar a insegurança com a criminalidade vigente nas cidades, visando prevenir a perda de seus bens. Outro motivo é tentar estabelecer um controle social (práticas mais adequadas de comportamento) nas pessoas que veem e sabem que existem sistemas de segurança no local e ainda em virtude de exigências legais e de seguradoras. Porém, é preciso refletir que somente sistemas adequados à realidade da empresa, integrados e bem instalados oferecerão a estas empresas aquilo que buscam quando desejam adquirir os produtos ou serviços. E mais, é preciso haver a perspectiva de manutenção preventiva e corretiva, e mesmo, revisão dos planos de segurança, visto que os riscos migram e modificam-se com o tempo e circunstâncias de um negócio ou localidade.

O fato de a segurança ser algo inerente ao viver das pessoas, e uma necessidade básica, como afirma Maslow, não significa que estruturar um plano de segurança ou uma ação de segurança seja algo simples e separado da realidade das organizações em que se quer implantar. É ainda Meirelles (2011) que afirma a necessidade de 3 perguntas estratégicas serem respondidas: O que se quer do sistema de segurança? O que é permitido fazer? O que o sistema de segurança sabe fazer? Perguntas essenciais juntamente com os recursos disponíveis e o alinhamento estratégico para a definição do sistema mais adequado à organização.

Isso é um alerta, portanto para que as organizações busquem profissionais da área de segurança que tenham experiência e qualificação para tal, que as escolas de formação destes profissionais se adequem as novas realidades do mercado e principalmente que os próprios profissionais invistam na sua qualificação, não só com cursos e diplomas, mas, no desenvolvimento de habilidades essenciais a qualquer negócio na atualidade e ofereçam às empresas muito mais do que uma câmera, um alarme ou qualquer sistema isoladamente.

REFERÊNCIAS

MEIRELES, N. R. Gestão Estratégica do sistema de segurança: conceitos, teorias, processos e prática. Sicurezza. Coleção gestão de riscos. São Paulo. 2011.

LIMA, S. A. Manual de Consultoria em segurança empresarial. Editora Gregory.  São Paulo. 2014.

RODRIGUES, S. A. Plano de segurança para as escolas do Estado de São Paulo: o controle eletrônico através das câmeras. 2009.

SABARA, M. T. Ribas; ALVES, Daniela Alves de. Disciplina e Controle: análise de uma rede de monitoramento visual.2015.

SOUZA; et al. Câmeras de segurança e seus sistemas tecnológicos: percepções sobre os motivos da utilização. Anais do XIV SEGET. Rezende. 2017.

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