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Âncora 1

FRAUDE

Fraudes empresariais: conceitos iniciais e o comportamento humano

Cláudio dos Santos Moretti, CES, ASE
Diretor da CSM – Consultoria e Treinamento
em Segurança Empresarial | claudio_moretti@uol.com.br

21/12/2020

Fraude é uma ação ilícita e desonesta, caracterizada pela falsificação de produtos, documentos, marcas, registros contábeis, etc. É um ato intencional de omissão ou manipulação.

O conceito de fraude foi abordado de forma abrangente e assertiva pelo Dr. Antonio Celso Ribeiro Brasiliano, em seu livro Gestão de Risco de Fraude – Fraud Risk Assessment – FRA, 2015 “Fraude não é apenas um furto comum, pela subtração direta de bens, mas toda forma de lesão ao direito de terceiros, tramada por artifícios executada por meios de métodos e práticas desonestas. Ou seja, a fraude é todo ato intencional destinado a assegurar ganhos ilegais. É uma conduta imprópria, infringindo os princípios da ética e dos valores morais”. 

 

As fraudes podem ir desde:

 

- Mentira e burla;

 

- Conivência;

 

- Pirataria;

 

- Estelionato, entre outros tipos;

 

- A fraude engloba todas as áreas da empresa, podendo ser: Ideológica; Contábil; Administrativa e financeira.

 

- As fraudes podem ter como origem os públicos: 

 

- INTERNA: colaboradores: gerentes, diretores, funcionários;

 

- EXTERNA: fornecedores, empreiteiros, entre outros.

 

Como exemplo de fraudes, podemos citar: 

 

a) Manipulação, falsificação ou alteração de registros ou documentos, de modo a modificar os registros de ativos, passivos e resultados (notas fiscais calçadas); 

 

b) Apropriação indébita de ativos (transferência indevida de recursos da empresa para a conta do fraudador); 

 

c) Supressão ou omissão de transações nos registros contábeis (omissão de receitas – caixa dois);

 

d) Registro de transações sem comprovação (quando sabidamente ilegais, por exemplo maximizando o volume das despesas com vistas a minimizar a base de cálculo do imposto de renda e contribuição sobre o lucro); 

 

e) Contabilização de operações fictícias (vendas artificiais para empresas do grupo);

 

f) Aplicação de práticas contábeis indevidas dolosamente (classificação incorreta das dívidas de curto prazo como se fossem de longo prazo, para apresentar melhores índices de liquidez). 

 

g) Entre muitas outras possibilidades.

 

Ou seja, a fraude não é um erro cometido por um descuido de uma pessoa ao realizar uma determinada ação, ainda que grande número de fraudes comece assim.

 

A pessoa comete um erro e se questiona: e se a transferência tivesse ido para minha conta? E se eles descobrirem? E se eu não falar nada? E se...

 

Pois é, nesse exemplo, pode surgir o fraudador.

 

Motivação do fraudador

 

No livro “Forensic Accounting and Fraud Examination” (Contabilidade Forense e Exame de Fraude) dos autores Mary–Jo Kranacher, Richard A. Riley, e Joseph T. Wells, de 2010, o professor Thomas usa a sigla MICE - Money, Ideology, Coercion and Ego/entitlement. (DICE - Dinheiro, Ideologia, Coerção e Ego/direitos), que é uma abordagem mais ampla e pode explicar a motivação para a fraude.

 

Alguns estudos foram realizados para identificar os fatores que levam uma pessoa “comum” (não criminosa ou sem histórico de cometimento de crimes a cometer fraudes.

 

No livro Other People’s Money: A Study in the Social Psychology of Embezzlement (Dinheiro de outras pessoas: um estudo na psicologia social do desfalque), 1953, Donald R. Cressey concluiu que a fraude ocorria pelos seguintes motivos: 

 

- A PRESSÃO, relacionada a um problema (geralmente financeiro) não compartilhável; 

 

- A RACIONALIZAÇÃO, que é uma justificativa para os atos desonestos;  

 

- A OPORTUNIDADE, que se refere à fragilidade da empresa nos controles e processos, na auditoria ou falta de capacitação.

 

Esses três elementos compõem o TRIÂNGULO DA FRAUDE.

 

Em 2004, David T. Wolfe e Dana R. Hermanson publicaram no CPA Journal 74-12 (O CPA Journal é um jornal de contabilidade publicado pela New York State Society of CPAs) e acrescentaram ao triângulo da fraude mais um vértice, a CAPACIDADE do indivíduo, ou seja, habilidades que desempenham um papel importante para a tomada de decisões e que podem facilitar o cometimento da fraude, criando, então, o DIAMANTE DA FRAUDE.

 

Em 2017, o Dr. Renato Santos, criou uma nova abordagem a qual foi desenvolvida em sua tese de doutorado que agrega um quinto elemento: a disposição ao risco. Refere-se à avaliação que o fraudador faz do perigo, à probabilidade e ao prazer pelos desafios – a aventura que é cometer uma fraude. 

 

A pessoa, para decidir se fraudará ou não, avalia os riscos inerentes à ação e, se não houver disposição suficiente ao risco, a fraude não acontecerá.

 

- RISCO PROBABILIDADE - Associado às probabilidades de impunidade caso a fraude seja descoberta;

 

- RISCO PERIGO - Associado ao medo das consequências do ato fraudulento;

 

- RISCO AVENTURA - Associado ao prazer em viver desafios e cumprir metas – assumido, muitas vezes, com aceitação explícita ou implícita do superior hierárquico;

 

- DISPOSIÇÃO AO RISCO - A pessoa, para decidir se fraudará ou não, avalia os riscos inerentes à ação e, se não houver disposição suficiente ao risco, a fraude não acontecerá;

 

- RACIONALIZAÇÃO - Discernimento do indivíduo sobre o que é certo e o que é errado; percepção moral.

 

Dessa forma, ele criou o PENTÁGONO DA FRAUDE.

 

Os quatro modelos (DICE, Triângulo, Diamante e Pentágono) buscam elucidar as motivações e os facilitadores que possibilitam a ocorrência de uma fraude corporativa. 

 

O fraudador – Homem comum

 

Mas quem é este fraudador? Seria uma pessoa de má índole? Seria um criminoso? 

 

Na verdade, pelo menos aos olhos do próprio fraudador não é assim que ele se vê.

 

Veja um exemplo tirado do livro A Mais Pura Verdade Sem Desonestidade, de Dan Ariely, 2012.

 

Jimmy tem 8 anos e volta para casa da escola com uma anotação do professor, que diz:

 

“Jimmy roubou um lápis do aluno sentado ao lado.” 

 

O pai de Jimmy fica furioso e faz de tudo para dar uma lição no garoto e fazê-lo entender como ficou chateado e decepcionado, deixando-o de castigo em casa por duas semanas. 

 

“E espere sua mãe voltar para casa!”, diz, em tom de ameaça, para o menino. 

 

Finalmente, ele conclui: 

 

“Além do mais, Jimmy, se você precisava de um lápis, por que não me disse? 

 

Você sabe muito bem que posso trazer dezenas de lápis do trabalho.”

 

“Para testar essa ideia, fizemos inicialmente uma experiência com uma versão universitária da piada do lápis: um dia, entrei furtivamente no alojamento do MIT e distribuí pelas muitas geladeiras comunitárias duas iscas tentadoras. 

 

Em metade das geladeiras, coloquei embalagens com seis latas de Coca-Cola; em outras, um prato de papel com seis notas de $1.

 

Eu voltava de vez em quando para verificar as geladeiras e registrar o que estava acontecendo com o refrigerante e o dinheiro - medindo o que chamamos, em termos científicos, a meia-vida da Coca-Cola e do dinheiro.

 

Como poderia imaginar qualquer pessoa que já tenha passado por um alojamento, em 72 horas todas as Cocas haviam sumido, mas o que foi especialmente interessante é que ninguém tocou no dinheiro.

 

Mas esse pequeno experimento sugere que os seres humanos estão prontos e dispostos a roubar algo que não se refira explicitamente a valor monetário.

 

No entanto, evitamos roubar dinheiro diretamente de tal forma que chegaria a deixar orgulhoso até mesmo o mais devoto professor de escola dominical. 

 

De forma semelhante, podemos pegar um pouco de papel sulfite do escritório para usar na impressora de casa, mas seria altamente improvável que viéssemos a pegar $3,50 do caixa, mesmo que imediatamente utilizássemos o dinheiro para comprar papel para a impressora de casa”.

 

Vamos fazer uma ligação entre o comportamento das pessoas e a fraude empresarial.

 

O fraudador não se vê como um criminoso e, normalmente, são pessoas respeitáveis no trabalho e na sociedade. 

 

Não são pessoas com registros de antecedentes criminais ou ações pessoais condenáveis.

 

O motivo é que ele ainda se acha uma pessoa íntegra e procura justificar suas ações para si mesmo.

 

Além disso, nós podemos ter uma “percepção” diferente em relação a fraude. 

 

No livro do sociólogo Antonio Carlos Almeida, A Cabeça do Brasileiro de 2007, ele publicou uma pesquisa onde uma das perguntas era:

 

“Como considerar a atitude do funcionário público que ajuda uma empresa a ganhar um contrato no governo e depois recebe dela um presente de Natal?”. Para 80% dos que não sabem ler ou escrever, isso é apenas um “favor” ou um “jeitinho”. Para 72% dos que concluíram a universidade, é corrupção e ponto final.

 

Neste caso, ele relacionou o grau de escolaridade para distinguir as percepções das pessoas em relação a fraude e isso pode ocorrer na empresa, dependendo da cultura da empresa.

 

Conclusão - Ética

 

A cultura empresarial reúne crenças, hábitos, valores e comportamentos que são resultados do conceito ético e moral dos colaboradores que podem estar alinhados as diretrizes da empresa, ainda que não estejam formalmente estabelecidas.

 

Portanto, o comportamento dos administradores pode influenciar diversas ações dos colaboradores, apenas guiados pelo “exemplo”.

 

Se a direção da empresa paga suborno ao fiscal então eu também posso...

 

Se a empresa paga “por fora” quer dizer que eu também posso...

 

A fraude não é uma peculiaridade do brasileiro, ela ocorre no mundo todo, com maior ou menor intensidade, dependendo do local, da legislação, do comportamento ético de um determinado grupo, etc.

 

O código de ética da empresa pode “lembrar” o colaborador o que se espera dele em determinadas situações, além disso, o exemplo pode influenciar de modo significativo as atitudes dos subordinados hierarquicamente.

 

Para concluir, gostaria de lembrar, de forma simples e pratica, como foi apresentada pelo Dr. Mário Sérgio Cortella no seu livro Qual é a Tua Obra?, de 2015, o que é ética: “Ética é o conjunto de valores e princípios que nós usamos para decidir as três grandes questões da vida: Quero?, Devo?, Posso? Tem coisa que eu quero, mas não devo, tem coisa que eu devo, mas não posso e tem coisa que eu posso, mas não quero.”

 

Por isso, existem empresas e pessoas dizem: “Não fazemos isso, não fazemos qualquer negócio” e outras, cujo lema é “fazemos qualquer negócio”. 

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