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GESTÃO

Âncora 1

Gerenciamento de crises,
aprendendo com os erros

Cláudio dos Santos Moretti, CES, ASE 

Diretor da ABSEG e professor do MBS Brasiliano INTERISK.

As tragédias se repetem, em muitos casos por motivos similares, a falta de preparo e de planejamento de ações para enfrentar situações de crise. O homem sempre conviveu com grandes tragédias e tentou sobreviver a elas para a continuação e a preservação da espécie (ou do negócio), isso faz parte do seu instinto de sobrevivência, mas o planejamento para estas situações também não é recente. 

No livro Administração de Desastres, escrito pelo Tenente-Coronel do Corpo de Bombeiros do RJ, Sérgio Baptista de Araújo, ele cita o planejamento elaborado por Noé, o qual utilizou os princípios básicos de uma administração de emergências, que foram:

1º. Soube prever um determinado cenário;

 

2º. Conseguiu estimar suas consequências;

 

3º. Definiu as vulnerabilidades específicas;

 

4º. Na impossibilidade de salvar a todos, salvou aqueles que por serem mais aptos para perpetuarem a respectiva espécie;

 

5º. Estabeleceu um Plano de Emergência completo e concreto – Plano de Fuga + Plano de Mitigação + Plano de Abrigagem + Plano de Gestão de Conflitos + Plano de Alimentação para 40 dias e 40 noites;

 

6º. Após isso estabeleceu um Plano de recuperação através da liberação dos animais e sua reintegração, adaptação ao meio, de forma sustentável.

 

Na sequência, Araújo cita a primeira organização de resposta às emergências no mundo ocidental, a qual surgiu em Roma em 6 A.C quando o Imperador Augustus, criou uma organização de vigilância e luta permanente contra os incêndios que assolavam Roma desde sempre. Estava então criado o “Vigiles” composto de sete “cohortes” (batalhões) compostos de cerca de 560 homens cada, estando assim criada a primeira organização de controle de emergências.  

É claro que de lá para cá, as coisas mudaram e evoluíram, mas ainda estamos patinando em várias questões, principalmente em relação a preservação da vida.

Em muitos casos o custo tem dado espaço ao ceifamento de vidas e, infelizmente, temos diversos exemplos de casos onde a falta de investimento trouxe a morte.

Em qualquer tipo de plano, seja de segurança, emergência ou de continuidade do negócio deve seguir uma sequência basilar para todos os de segurança, a qual é:

1º. VIDA;

2º. PATRIMÔNIO;

3º. CONTINUIDADE DO NEGÓCIO.

Todas as vezes que se alterou esta sequência os resultados foram desastrosos.

Como escreveu Maquiavel em Discursos de Tito Lívio, 1531.

 “...mas a ambição do homem é tão grande que, para satisfazer uma vontade presente, não pensa no mal que daí a algum tempo pode resultar dela”.

Nem sempre é possível prever todas as possibilidades, todas as dimensões do que pode acontecer, mas o planejamento prévio de uma situação de crise, com certeza auxiliará nas tomadas de decisões.

Um exemplo disso foi o caso do 11 de setembro de 2001, um fato que marcou a história e mudou a forma das pessoas enxergarem o mundo e, particularmente, o terrorismo.

Durante a NRF (National Retail Federation) Big Show 2016, realizada na cidade de Nova Iorque (EUA), que é o maior evento de varejo do mundo, teve uma apresentação de Rudolph Giuliani, o qual disse que ele, como ex-prefeito durante o ataque de 11 de setembro, que havia 26 planos de segurança, porém, nenhum para ataques terroristas aéreos. Nesse caso, ele disse não saber o que fazer naquela situação, a qual não havia sido prevista, devido a forma assimétrica adotada pelos terroristas, mas que, com o que havia aprendido e treinado para os planos que foram desenvolvidos, conseguiu fazer o gerenciamento de crise que atendeu as necessidades do momento. Foi o preparo antecipado, através de outras situações de crises que foram planejadas que ele conseguiu gerenciar aquela situação que mudaria o mundo e servirá de estudo de caso por toda as nossas vidas.

Samuel Henry Prince, desenvolveu seu doutorado em sociologia na Universidade da Columbia, nos EUA, e escreveu Catastrophe and Social Change (Catástrofe e Mudança Social), publicado em 1920, foi a primeira análise sistemática do comportamento humano durante uma calamidade. “A vida fica parecendo metal derretido” escreveu ele. “Velhos costumes desmoronam e a instabilidade impera.”

O trabalho foi sobre um dos desastres mais épicos da história, desde a explosão do navio de munições Mont Blanc em 1917 - uma das maiores explosões até à invenção da bomba atômica (Apud Ripley, 2008).

Voltando a alguns detalhes mais contemporâneos, relativos ao 11 de setembro, às 08h46, um Boeing 767 da American Airlines, a 790 km/hora bateu no prédio. De imediato ele eliminou quatro andares.

Com certeza, muitas pessoas ficaram absolutamente perdidas na confusão.

A jornalista Amanda Ripley, autora do livro IMPENSÁVEL – Como e Por Que as Pessoas Sobrevivem a Desastres (2008), depois de ouvir muitas pessoas que sobreviveram a desastres e analisar os resultados dos estudos realizados com os desfechos desses desastres, elaborou uma tese sobre a forma com que as pessoas se comportam quando o estresse chega no seu nível mais alto, seja passando por desastres, seja enfrentando acidentes ou troca de tiros.

De acordo com ela o conceito de ARCO DA SOBREVIVÊNCIA se enquadra em todas essas situações. 

O arco da sobrevivência é dividido em três fases que são resultados do comportamento humano.

A primeira fase é a NEGAÇÃO. A não ser em casos extremamente terríveis, tendemos a exibir algum tipo surpreendentemente criativo de negação liberada. A negação é a reação de medo mais insidiosa que existe O riso ou o silêncio são manifestações claras de negação, do mesmo modo que a demora.

Em média, os sobreviventes do WTC - World Trade Center, esperaram seis minutos antes de se dirigirem às escadas. De acordo com o estudo de 2005 do Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia (National Institute of Standards and Technology  - NIST) baseado em entrevistas com quase novecentos sobreviventes. (a média teria sido mais alta se as pessoas que morreram tivessem respondido ao levantamento). Alguns chegaram a esperar 45 minutos.

Cerca de mil indivíduos gastaram tempo para desligarem seus computadores, de acordo com o NIST.

Em um levantamento de 1.444 sobreviventes depois dos ataques 40% disseram que recolheram coisas antes de sair.

Esse processo de pegar coisas é comum em situações de vida ou morte. Tendo de enfrentar o vazio, queremos estar preparados com o máximo de suprimento possível. 

A segunda fase é a DELIBERAÇÃO. O que fazer? Que decisão tomamos? Pensamos e percebemos as coisas de modo diferente. 

A maior parte das pessoas não sabia como se orientar pelos corredores de transferência nos andares mais baixos. O Relatório da Comissão 11/09 concluiu que pessoas podem ter morrido em consequência disso.

A terceira fase é o MOMENTO DECISIVO. Aceitamos o fato de que estamos em perigo, deliberamos nossas ações. Agora agimos.

As três fases cronológicas, negação, deliberação e momento decisivo, formam a estrutura do livro de Amanda Ripley. 

Nele é visível, depois dos relatórios, a forma com que as pessoas se comportam ante uma situação de estresse extrema e apresenta algumas surpresas, como por exemplo:

- Somos lentos para reconhecer exceções.

- Ao contrário das expectativas populares, em catástrofes verdadeiras, a civilização se mantém. 

- As pessoas se movimentam em grupos sempre que podem.  

- Em geral, são de longe mais educadas do que normalmente o são.

- Procuram manter a hierarquia.

Quanto maior o estresse, menor é a visão, quanto mais o estresse aumenta, maior a tendência de ficar obcecado a um determinado ponto. Conhecido como visão de túnel, esquecendo-se do que está a sua volta.

O treinamento faz a diferença.

O batimento cardíaco de uma pessoa não treinada para as situações de vida ou morte pode chegar num instante a duzentos batimentos por minuto, um nível extremo, no qual é difícil de negociar, de entender o que acontece de maneira clara para poder tomar suas decisões. 

Diógenes Lucca autor do livro Diário de um Policial – o submundo do crime narrado por um comandante do GATE (2016), descreve as condições para um bom ambiente para os participantes de um treinamento. Este ambiente deve proporcionar três níveis:

- O primeiro é o crescimento vertical, que ocorre pelo acréscimo de novos conhecimentos que são incorporados.

- O segundo é o crescimento horizontal, que é a revisão daquilo que já conhecemos, mas que é explorado de outra maneira, com algumas adaptações.

- E o terceiro nível é a rede de relacionamentos (adaptado), neste nível, na área empresarial, são as trocas de informações entre os procedimentos em casos assemelhados.    

Os erros nos treinamentos

Depois do primeiro ataque ao WTC, em 1993, muitos dos delegados de incêndio se queixaram da falta de treinamento. Os delegados de incêndio eram os responsáveis pela organização de abandono do prédio.

Depois deste ataque, os treinamentos de incêndios eram feitos duas vezes por ano, mas a definição de treinamento de incêndio do WTC era pedir a todo mundo que se reunisse no meio de seus andares e apanhasse um telefone de emergência para receber instruções. Os empregados em geral sequer iam até as escadas, quanto mais desciam por elas.

O papel das pessoas comuns era esperar ordens.

Menos da metade dos sobreviventes jamais tinha entrado nas escadas antes, como descobriu o relatório do NIST (National Institute of Standards and Techonology). Apenas 45% dos 445 trabalhadores do WTC entrevistados depois do 11/09 sabiam que o prédio tinha três escadas de acordo com os resultados preliminares de um estudo concluído pela Universidade de Columbia.  

No 11/09 os delegados de incêndio não sabiam muito mais que as pessoas comuns. Daqueles entrevistados para o estudo da Universidade de Columbia, 94% jamais tinham saído dos prédios como parte de um treinamento. Apenas 50% disseram que tinham conhecimento suficientes para saírem sozinhos.

Para que as pessoas sobrevivam aos grandes desastres elas precisam ser treinadas, através de planos que sejam testados e que todos tenham participação nos simulados, que devem ser mais próximos de uma situação real.

 “O planejamento não diz respeito a decisões futuras, mas às implicações futuras de decisões presentes” - (Peter Drucker)

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