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Âncora 1

GESTÃO

Gerenciamento de risco, sustentabilidade dos fundos de pensão

Luiza Miyoko Noda
Engenheira civil especializada em Processamento de Dados com MBA Executivo em Finanças.
É Assessora de Compliance em Entidade Fechada de Previdência Complementar

As Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC), conhecidas como Fundo de Pensão, são instituições sem fins lucrativos, que têm por objetivo administrar os recursos de trabalhadores, para lhes garantir qualidade de vida e proteção durante a aposentadoria. Elas tiveram origem na década de 1960, vindo a ser regulamentadas em 1977 e, passados mais de quarenta anos, o segmento acumulou um montante de R$ 846 bilhões em recursos administrados, representando 12,8% do PIB brasileiro, sendo um dos maiores mecanismos de formação de poupança estável e de longo prazo.  

O Fundo de Pensão, comparado a outros países, a poupança brasileira ainda é baixa, e a “Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) apontou para o aumento da importância dos fundos de pensão para a complementação das aposentadorias públicas em todo o mundo”. 

O MMGPI, sigla de Mercer Melbourne Global Pension Index, é um estudo publicado, anualmente, pelo Centro Australiano de Estudos Financeiros em conjunto com a Mercer e ranqueia o sistema de fundo de pensão, baseado em 3 subitens: adequação, sustentabilidade e integridade. Neste estudo, o Brasil se encontra na classe C, de uma escala que varia da classe A até a classe E, e significa que tem algumas características boas, mas também tem grandes riscos e/ou deficiências que devem ser abordadas e, sem essas melhorias, sua eficácia e/ou sustentabilidade a longo prazo pode ser questionada. Para melhorar a posição, o país deve considerar algumas recomendações, dentre elas, aumentar a idade média de aposentadoria, aumentar o nível de poupança, aumentar a cobertura em toda força de trabalho, reduzir o acesso aos benefícios antes da aposentadoria e melhorar a transparência das operações dos planos, aumentando assim a compreensão e confiança de todas as partes interessadas.

A formação da previdência privada depende da adesão e contribuição voluntária dos participantes e, conforme o tipo do plano, da contribuição de seus empregadores, assim, a credibilidade nas entidades, a quem irão entregar os recursos para serem administrados, é de suma importância, sendo vital para sustentabilidade do negócio.

Os profissionais, deste tipo de organização, têm o dever de agirem no melhor interesse dos participantes e patrocinadores dos planos que administram, realizar suas atividades com boa fé, lealdade e diligência, observando os princípios de segurança, rentabilidade, solvência, liquidez e transparência.  Devem zelar pela manutenção de elevados padrões éticos, adotando práticas que garantam o cumprimento do seu dever fiduciário. E, a Resolução CGPC nº 13/2004 se tornou um importante marco regulatório para disseminação de princípios, regras e práticas de governança, gestão de risco e controles internos, de modo a garantir que interesses conflitantes não prejudiquem o alcance dos objetivos das entidades.

Os fundos de pensão estão sujeitos a diversas vulnerabilidades e, com o propósito de mitigá-las, devem implementar o monitoramento dos riscos aos quais estão submetidos, a partir de prévia definição dos níveis de exposição considerados aceitáveis, devem determinar e divulgar as responsabilidades e zelar  pela conformidade com normas, leis e padrões, se configurando em um constante e dinâmico trabalho, no sentido de reforçar a confiabilidade e estabilidade das entidades.

A gestão de riscos e compliance vem se tornando muito importante no dia a dia das organizações não só em função de vulnerabilidades que podem ser evitados por um gerenciamento adequado, mas pela sua importância estratégica, fazendo parte do processo de tomada de decisões, da proteção de ativos e criação de valor. E, para cumprir com este propósito, a área de Gestão de Riscos e Compliance deve ter o apoio da alta administração, para que possam ter acesso às informações, suporte às suas atividades, bem como a independência na aferição da conformidade dos controles nas demais unidades da organização. O seu papel é assessorar a administração na interpretação e impacto da legislação, monitorando as melhores práticas em sua execução, além de prover treinamentos sobre regulamentação aos empregados e capacitação dos órgãos de assessoramento, de supervisão e de deliberação da entidade. 

O ambiente de controle é consequência do modelo da organização e depende da forma como seus dirigentes conduzem o negócio, influenciando os colaboradores, e refletindo no comprometimento de se manterem no propósito de reduzir os riscos e de aumentar da eficácia dos processos, sendo primordial para a implementação da estrutura de controles internos e gerenciamento de riscos. Espera-se que a toda a entidade esteja em compliance, que vai além de cumprir normativos, exigindo a adoção de padrões de integridade que não precisam estar, necessariamente, expressos em textos regulamentares, assim os programas educativos e de treinamento devem ser capazes de demonstrar os malefícios da corrupção e condutas antiéticas para a entidade e para a sociedade, sendo esperado que a alta administração sirva de exemplo mantendo uma conduta irrepreensível. 

O Brasil tem uma relação de cooperação com a OCDE, e vem adotando medidas para atender as diretrizes para a governança de fundos de pensão e segue, também,  os princípios da  IOPS – Organização Internacional de Supervisores de Fundos de Pensão, e criou, em 2009, a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (PREVIC), órgão responsável pela supervisão dos fundos de pensão, com estrutura e operações independentes. A PREVIC nasceu com o propósito de articular estratégias e medidas com vistas a desenvolver o sistema de previdência complementar e estabelecer ações preventivas.

Dentre as ações, a PREVIC implementou a Supervisão Baseada em Riscos, com o propósito de atuar de forma prudencial sobre as origens dos riscos e induzir uma gestão proativa das entidades. A experiência internacional mostra que os órgãos de supervisão devem ir além da verificação de aderência a normas e devem se dedicar à educação dos dirigentes e ao fomento do sistema, evidenciando a importância dos controles internos e da gestão dos riscos, tendo como resultado o aumento da rentabilidade dos ativos e a redução de perdas oriundas dos riscos intrínsecos à gestão de planos de previdência. E, como ferramenta de educação, a PREVIC elaborou uma série de guias de melhores práticas em fundo de pensão, com o propósito de orientar e estabelecer recomendações, ao sistema, alinhadas às melhores práticas internacionais.

No Brasil, os dirigentes de fundos de pensão vêm enfrentando grandes desafios. Há um crescente aumento da longevidade, um importante fator de risco que pode gerar déficit no plano, potencializado por um cenário de redução de taxa de juros que reduz os retornos dos investimentos, podendo requerer, dos participantes e patrocinadores, um aporte adicional.  Assim, para poder fazer frente a estes cenários, dirigentes necessitam diversificar os investimentos, alocando recursos em ativos de maior risco e estruturas mais complexas.

Ao mesmo tempo que os dirigentes necessitam de uma maior flexibilidade para a gestão dos recursos, nos deparamos com notícias de possíveis irregularidades em fundos de pensão, causando certo receio e desconfiança da sociedade. E, buscando fortalecer a credibilidade e solidez das entidades, a PREVIC vem promovendo ações de caráter preventivo e de aperfeiçoamento da gestão de riscos e,  na linha da SBR, passou a supervisionar, permanentemente, as Entidades Sistemicamente Importante (ESI), estabeleceu critérios mais rígidos para habilitação de dirigentes, enfatizou a importância da gestão profissional e da responsabilização no processo decisório, fortaleceu as linhas de defesa por meio do aprimoramento do processo de auditoria, e estabeleceu medidas prudenciais e preventivas destinadas a assegurar a estabilidade e o funcionamento regular de planos administrados por EFPC.

O modelo das três linhas de defesa tem sido defendido como uma referência na implantação de sistema de gerenciamento de riscos e controles internos, e visa assegurar que a informação do processo de gestão de riscos seja adequadamente comunicada e utilizada como base para a tomada de decisões, e determina com clareza as responsabilidades em todos os níveis organizacionais. Em síntese, na primeira linha de defesa todos os colaboradores são responsáveis pelos controles internos e, como donos do processo, devem fazer o acompanhamento dos riscos, reportando as falhas e deficiências aos órgãos responsáveis. A segunda linha de defesa é responsável por implementar modelos, métodos e práticas de gerenciamento, com o intuito de suportar os donos dos riscos. E a auditoria interna cumpre a função de terceira linha de defesa, auditando os processos e controles, e verificando se as medidas para mitigação de riscos estão sendo aplicadas conforme os planos e políticas estabelecidos. Neste ponto o órgão regulador dos fundos de pensão flexibilizou, ao conselho deliberativo, a implementação da auditoria interna, permitindo que a avaliação dos controles fosse executada por auditor independente, desde que não fosse o mesmo auditor responsável pela auditoria das demonstrações contábeis. Contudo, essa não é uma ideia pacificada no mercado, dado que o auditor externo não estaria dentro da entidade, contrário das linhas de defesa que estão dentro da organização.

Em continuidade às implementações de melhores práticas, e compatível com o modelo das linhas de defesa, a PREVIC determinou que os fundos de pensão, classificados como ESI, constituam o comitê de auditoria, a partir de 31/12/2018, com atribuição de avaliar e monitorar os processos, sistemas e controles, sendo o órgão de suporte técnico do conselho deliberativo, prestando assessoramento ao colegiado em matérias relacionadas a riscos e controles da entidade. Recentemente, o Conselho Monetário Nacional (CMN) atualizou a norma que define regras para os investimentos das EFPC, exigindo delas o aprimoramento da gestão, de modo a mitigar os riscos relacionados aos ativos e proporcionar maior segurança aos proprietários dos recursos.  O normativo buscou fortalecer as linhas de defesa das entidades, com foco no aperfeiçoamento do processo decisório, redução dos riscos de potenciais conflitos de interesse e exigência de maior robustez nos controles internos. E, o dever fiduciário dos envolvidos no processo de assessoramento e decisão de investimentos tornou-se mais claro.

Um bom processo de gerenciamento de riscos deve considerar fatores internos, como a complexidade da estrutura organizacional e dos planos administrados, suas mudanças e a qualificação técnica do seu pessoal, bem como fatores externos, como questões econômico-financeiras e os avanços tecnológicos, que podem impactar no alcance dos objetivos da EFPC, ou seja, o risco é dinâmico, e todos os riscos que possam comprometer a realização destes objetivos tem que ser, continuamente, identificados, avaliados, controlados e monitorados e, todos os controles devem ser reavaliados e aprimorados e, como citado no Manual da Abrapp “o gerenciamento de risco é um processo de persistência, não um programa esporádico”.

Não há negócio sem risco, e um estudo global da consultoria e seguradora AON, em conjunto com a Wharton School, da Universidade da Pensilvânia nos EUA, evidenciou a correlação entre a gestão de risco mais sofisticada e um melhor desempenho financeiro, rentabilidade e resiliência do negócio.  Assim, a Gestão Integrada dos riscos, a manutenção de uma estrutura apropriada com atribuição clara de responsabilidades em relação às operações e supervisões, e a criação de uma área específica que se reporte diretamente às instâncias superiores é fundamental para a segurança e solidez das operações realizadas pelos fundos de pensão e o cumprimento de seus objetivos, contribuindo para percepção de confiança e  sustentabilidade do sistema.

FONTES

Revista Previdência Complementar nº 418 – Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar - ABRAPP

Melbourne Mercer Global Pension Index – https://www.mercer.com.au/our-thinking/mmgpi.html

Guia de Boas Práticas para EFPC - Sob a Ótica da Legislação Anticorrupção - http://www.abrapp.org.br/GuiasManuais/Guia_anticorrupcao.pdf

Guia das Melhores Práticas em Fundos de Pensão http://www.previc.gov.br/central-de-conteudos/publicacoes/guias-de-melhores-praticas

Manual de Controles Internos - Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar - ABRAPP

Gerenciamento de Riscos Corporativos - Evolução em Governança e Estratégia do IBGC

Gestão de Risco e Controle para os Fundos de Pensão dos Servidores Públicos – artigo http://gama-ca.com.br/wp content/uploads/2016/02/Artigo-Riscos-e-compliance-27-01-15-v.-final.pdf

Relatório de Estabilidade da Previdência Complementar - Junho 2018 da PREVIC

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